O roteiro foi adaptado do livro homônimo da escritora chilena Isabel Allende, sobrinha do ex-presidente chileno Salvador Allende, assassinado pelos militares durante o golpe de 1973, que é inclusive o climax do filme. A estória basicamente gira em torno da vida de Esteban Trueba (Jeremy Irons, num papel que cai como uma luva para ele) que compra um latifúndio no interior e em duas décadas o transforma numa da maiores fazendas produtivas do país. Só que, para isso, Esteban explora os antigos moradores da fazenda, tornando-os quase como escravos. Até que um dia, o filho de um deles, Pedro Garcia (Antonio Banderas) começa a insuflar os trabalhadores contra esse estado de coisas.
Temos ainda várias tramas paralelas. O título se deve aos poderes sensitivos de Clara (Meryl Streep, numa boa atuação) que é capaz de prever acontecimentos terríveis e premoniza vários deles durante o filme. Clara é apaixonada por Esteban desde criança e se casa com ele quando este já é um rico fazendeiro. Ambos vão morar na fazenda e levam consigo a irmã de Esteban, a sisuda Ferula (excepcionalmente interpretada por Glenn Close), que tem uma relação conturbada com Esteban, ainda mais quando esse começa a desconfiar que a irmã e sua esposa tem um leve caso de lesbianismo.
Do casamento entre Esteban e Clara nasce Blanca (Winona Ryder, apenas razoável) que quando moça vai se apaixonar justamente pelo personagem de Banderas. E todas essas tramas se entrelaçam em meio a um crescente sentimento de revolta, mostrado primeiro apenas entre os trabalhadores da fazenda, depois entre os trabalhadores do país todo, enquanto Esteban Trueba é convidado a entrar na política pelos corredores da direita, ou seja, tomando um caminho oposto aos ideias da filha, por exemplo.
Como se vê, tudo isso pode ser facilmente contado através de clichês intermináveis, e infelizmente é exatamente isso que o roteiro faz. Aliás, o roteiro lança mão de outros clichês acessórios, que nada acrescentam ao filme, como a morte dos pais de Clara, em que se mostra na tela a cabeça da mãe dela sendo segurada por um homem, numa cena totalmente inútil em que fica até difícil dizer se é cômica ou trágica. Outro exemplo são as cenas de nudez totalmente desnecessárias, pois nada acrescentam ao roteiro e não tem importância alguma para o desenvolvimento da estória, tornando-se assim gratuitas e de mau gosto.
Felizmente também há aspectos positivos, méritos principalmente da estória em si (não li o livro, mas dizem que é mil vezes melhor que o filme). A forma com que o filho bastardo de Trueba se envolve com sua família é muito bem desenvolvida, e ao final chega até a ser surpreendente. O personagem de Glenn Close, apesar de não ser crucial para o enredo, por mérito dela consegue ser um ponto alto do filme, e inclusive ajuda a caracterizar melhor os personagens que a rodeiam. E algumas passagens são muito bem realizadas, como a própria morte de Ferula, numa cena até comovente, e as cenas de tortura de Blanca mais ao final do filme.
Um grave erro do roteiro ao meu ver é deixar de mencionar no filme que estamos no Chile. O nome do país nunca é citado, e Esteban Trueba se refere ao mesmo sempre como “my country” ou “our country” (meu / nosso país). Isso ficou ridículo. Além do mais, nomes importantes da estória do golpe militar, como o próprio Salvador Allende e o ditador Augusto Pinochet, sequer são mencionados. Ou seja, quiseram contar uma estória particular de um país de uma forma genérica, que pode se aplicar a uma republiqueta qualquer, de qualquer lugar. Isso deixou o filme sem identidade, e com certeza essa atitude descolou demais o filme do livro, e quem saiu perdendo sem dúvida foi o filme.
O saldo geral é positivo, A Casa dos Espíritos é um filme bom, mas principalmente para quem leu o livro, a sensação que fica é que poderia ser muito mais inesquecível. Prova disso é que este filme não é assim tão famoso, apesar do elenco grandioso que possui.
Nota – 8.0 ***
Veja abaixo o trailer original do filme (qualidade mediana)
Filed under: Drama, FILMES, Romance | Tagged: Antonio Banderas, Chile, Ditadura, Glenn Close, Jeremy Irons, Meryl Streep, Pinochet | Leave a comment »