A casa dos espíritos (The House of Spirits, 1993)

A sensação que se tem ao terminar de assistir este filme é que ele poderia ser melhor dirigido, e ter o roteiro mais bem acabado. Isso talvez se explique pelo fato de que tanto roteiro como direção foram entregues à mesma pessoa – o dinamarquês Bille August, renomado diretor à época por já ter ganho duas Palmas de Ouro em Cannes. Porém o fato de um dinamarquês trazer para o cinema uma estória tão particular de um país da América do Sul (no caso, o Chile) acabou não sendo tão boa quanto poderia ser, e o filme só não virou uma catástrofe porque contou com um elenco cheio de estrelas e também porque a estória contada, por si só, é suficientemente boa.

O roteiro foi adaptado do livro homônimo da escritora chilena Isabel Allende, sobrinha do ex-presidente chileno Salvador Allende, assassinado pelos militares durante o golpe de 1973, que é inclusive o climax do filme.  A estória basicamente gira em torno da vida de Esteban Trueba (Jeremy Irons, num papel que cai como uma luva para ele) que compra um latifúndio no interior e em duas décadas o transforma numa da maiores fazendas produtivas do país. Só que, para isso, Esteban explora os antigos moradores da fazenda, tornando-os quase como escravos. Até que um dia, o filho de um deles, Pedro Garcia (Antonio Banderas) começa a insuflar os trabalhadores contra esse estado de coisas.

Temos ainda várias tramas paralelas. O título se deve aos poderes sensitivos de Clara (Meryl Streep, numa boa atuação) que é capaz de prever acontecimentos terríveis e premoniza vários deles durante o filme. Clara é apaixonada por Esteban desde criança e se casa com ele quando este já é um rico fazendeiro. Ambos vão morar na fazenda e levam consigo a irmã de Esteban, a sisuda Ferula (excepcionalmente interpretada por Glenn Close), que tem uma relação conturbada com Esteban, ainda mais quando esse começa a desconfiar que a irmã e sua esposa tem um leve caso de lesbianismo.

Do casamento entre Esteban e Clara nasce Blanca (Winona Ryder, apenas razoável) que quando moça vai se apaixonar justamente pelo personagem de Banderas. E todas essas tramas se entrelaçam em meio a um crescente sentimento de revolta, mostrado primeiro apenas entre os trabalhadores da fazenda, depois entre os trabalhadores do país todo, enquanto Esteban Trueba é convidado a entrar na política pelos corredores da direita, ou seja, tomando um caminho oposto aos ideias da filha, por exemplo.

Isabel Allende, autora do livro que originou o filme

Isabel Allende, autora do livro que originou o filme

Como se vê, tudo isso pode ser facilmente contado através de clichês intermináveis, e infelizmente é exatamente isso que o roteiro faz. Aliás, o roteiro lança mão de outros clichês acessórios, que nada acrescentam ao filme, como a morte dos pais de Clara, em que se mostra na tela a cabeça da mãe dela sendo segurada por um homem, numa cena totalmente inútil em que fica até difícil dizer se é cômica ou trágica. Outro exemplo são as cenas de nudez totalmente desnecessárias, pois nada acrescentam ao roteiro e não tem importância alguma para o desenvolvimento da estória, tornando-se assim gratuitas e de mau gosto.

Felizmente também há aspectos positivos, méritos principalmente da estória em si (não li o livro, mas dizem que é mil vezes melhor que o filme). A forma com que o filho bastardo de Trueba se envolve com sua família é muito bem desenvolvida, e ao final chega até a ser surpreendente. O personagem de Glenn Close, apesar de não ser crucial para o enredo, por mérito dela consegue ser um ponto alto do filme, e inclusive ajuda a caracterizar melhor os personagens que a rodeiam. E algumas passagens são muito bem realizadas, como a própria morte de Ferula, numa cena até comovente, e as cenas de tortura de Blanca mais ao final do filme.

Um grave erro do roteiro ao meu ver é deixar de mencionar no filme que estamos no Chile. O nome do país nunca é citado, e Esteban Trueba se refere ao mesmo sempre como “my country” ou “our country” (meu / nosso país). Isso ficou ridículo. Além do mais, nomes importantes da estória do golpe militar, como o próprio Salvador Allende e o ditador Augusto Pinochet, sequer são mencionados. Ou seja, quiseram contar uma estória particular de um país de uma forma genérica, que pode se aplicar a uma republiqueta qualquer, de qualquer lugar. Isso deixou o filme sem identidade, e com certeza essa atitude descolou demais o filme do livro, e quem saiu perdendo sem dúvida foi o filme.

O saldo geral é positivo, A Casa dos Espíritos é um filme bom, mas principalmente para quem leu o livro, a sensação que fica é que poderia ser muito mais inesquecível. Prova disso é que este filme não é assim tão famoso, apesar do elenco grandioso que possui.

Nota – 8.0 ***

Veja abaixo o trailer original do filme (qualidade mediana)


As Horas (The Hours, 2002)

ashoras_posterGosto tanto de cinema que resolvi publicar esse blog, e espero mantê-lo sempre daqui em diante. E o fato de gostar tanto acho que me credencia a dizer sempre o que penso; claro que gosto não se discute, e o que eu posso achar o maior barato outras pessoas podem achar uma chatice. Mas como o blog é meu, as opiniões serão minhas… (risos), e portanto às vezes algumas opiniões minhas talvez gerem muitas contestações, como é o caso provavelmente deste filme. 

Toda essa introdução é para me desculpar com a imensa maioria, que talvez ache esse filme muito bom, seja porque tenha um ótimo elenco, encabeçado por três damas da interpretação, Meryl Streep, Nicole Kidman e Julianne Moore (acompanhadas do competente Ed Harris), ou então porque a estória seja baseada em um livro famoso, que conta a vida de três mulheres em épocas diferentes, a escritora Virginia Woolf – feita por Kidman de nariz postiço e voz diferente – que está surtando e prestes a se matar (ela se afoga logo na primeira seqüência). As outras personagens principais são uma mulher atual, lésbica (Streep) que cuida de um doente de Aids (Harris), e a terceira é uma dona de casa do começo dos anos 50 (Moore) que tem um filho pequeno e tendências suicidas.

Ou seja, o filme consegue a proeza de juntar em duas horas de duração três estórias, em três épocas diferentes, que nada (mas nada mesmo) tem a ver uma com a outra: uma escritora abalada psicologicamente, uma lésbica que cuida de um aidético (!!!) e uma dona de casa que toda hora pensa em se matar, pouco ligando para o filho pequeno e o marido.

Bem, o fato é que perdi duas horas da minha vida assistindo esse filme. E olha que sou eclético e adoro todos os tipos de filmes: os que fazem pensar, os que fazem chorar, os que fazem rir, os de ação… e por isso acho que cada filme deve ser analisado segundo o “estilo” que segue. É difícil eu achar um filme totalmente ruim; geralmente isso acontece quando me arrependo totalmente de ter gasto algum dinheiro indo ao cinema para vê-lo ou alugando/comprando o DVD. Respeito a grande maioria que aprova este filme (no site e-pipoca a nota dele é 9,4) mas sinceramente, achei o filme confuso, sem sentido, as três estórias confundiram minha cabeça e no final não cheguei a conclusão nenhuma e não entendi que mensagem o filme quis passar.

Por isso não pensei duas vezes em “dar de presente” este DVD a um amigo que tenho que acabou de comprar seu DVD-Player e precisa começar a montar sua coleção. Só espero não ter perdido o amigo. De qualquer modo, pelo elenco que tem, se alguém conseguir me explicar o sentido do filme, talvez eu reveja minha opinião sobre ele.

Nota 6.0 – **

Veja abaixo o trailer original do filme (com legendas em português)